Como
uma nota musical, alta, aguda sonora, no meu mais íntimo do meu ser, sinto a
vergonha das terras manchadas de sangue indígena, das árvores cortadas, das espécies
perdidas, das águas desperdiçadas, da vida injusta e perdida de tanta gente que
nasce sem ter o que comer ou beber. Tenho vergonha de pertencer a um tempo em
que valores como a vida, seja ela de um ser humano ou animal ou vegetal, nada
valem, são números, são estatísticas, tão-somente, que ninguém destas pessoas
que se consideram donas do mundo e inteligentes, as veem como gente,
simplesmente. Como uma valsa, rodopio na sala que é este planeta, num frenesim
louco a tentar encontrar não o esplendor e auge de uma noite, mas o compasso de
alguém que me escute e me ouça, que me acompanhe ao balcão só para a sentir
respirar, a ela! Sinto na cara a brisa a bater-me de leve, despenteia-me os
cabelos e eu ouço, a Mãe Terra, bem dentro de mim, agarro na mão do meu alguém,
para que também ele a sinta através do meu peito. De repente por magia, a noite
ilumina-se e o céu fica como uma enorme tela, dos meus olhos escorrem-me lágrimas
ao ver as imagens do nosso planeta, animais livres acorrer nas savanas,
florestas inteiras cheias de vida, os mares cheios de cor. O meu coração
acelera, parece que tudo voltou ao que era, intocável, tola que eu sou…
Assusto-me com a mudança brusca de cena, um mundo à beira de se perder e
ninguém quer saber! Imagens atrozes, estas que agora passam, e que mais? Todo o
mundo as vê a toda a hora, são banais! Diz-me o alguém que está comigo,
retirando a mão do meu peito, não estou interessado, isto que me mostras está
fora de moda, ultrapassado. Agora tomamos conta do nosso planeta, poluímos? E depois?
compramos créditos de carbono. Precisamos de limpar a nossa imagem? Compramos rótulos
de sustentabilidade. Fico só no balcão, o alguém volta para dentro da sala,
onde a valsa que se dança, não é a minha. É a valsa dos dias de hoje, a valsa
do dinheiro, que tudo compra, corrompe, ludibria. Tomo a decisão de não voltar
a entrar, só danço ao som de música que me faça sentir bem, viva, útil, plena e
em comum com tudo o que me rodeia. Decididamente este tipo de valsa não é para
mim, talvez por isso amo tanto o som da harpa e violino, ao modo antigo sabem?
Descalço-me entro da floresta, dispo-me e deito-me na relva e colmo, debaixo de
um frondoso carvalho. Pirilampos dançam à minha volta, rodopiando, valsando com
as fadas. Uns espreitam daqui, outros dali, os elementais vão aparecendo,
querendo saber das novidades lá do baile dos humanos no grande salão.
Conto-lhes tudo desfeita em lágrimas, digo-lhes que lhes mostrei a magia na
nossa Mãe, que iluminou a céu, e contei-lhes também do meu falhanço, sinto-me
vazia, eu prometi ao menos que alguém me ouviria! E fracassei…
Olho
à minha volta e estou rodeada do povo das fadas, de anjos, de seres de luz, de
mestres. Não te preocupes, não fracassas-te nem tudo está perdido, pois tu
acreditas e estás aqui! Conheces-nos e nós a ti, vês-nos e nós a ti, ouves-nos
e nós a ti! Foi então que uma coruja me secou as lágrimas e um lírio me
enfeitou o cabelo. Ouvi chamar era a minha mãe, a Lua, corri para os seus
braços para ela me confortar como só ela sabe. Pedi-lhe desculpas: minha mãe,
não consegui, disse eu entre soluços e respiração ofegante. Então a Lua minha
mãe, passou a mão pelos meus cabelos e disse-me: “olha agora bem para mim. Vê o
que te quero mostrar”. Nesse instante a minha boca abriu-se de espanto, no
corpo celeste da minha mãe, as imagens eram tantas, mas tantas! Percebi
finalmente o que todos eles tentaram-me dizer este tempo todo, eu não fracassei,
eu não fracassei! Desatei aos gritos pela floresta. Obrigada minha mãe, agora
percebi que não estou sozinha, tantas, mas tantas como eu espalhadas pelo mundo
afora, que também pensam que fracassaram. Tantas iguais a mim, que alegria, abraçei-os
a todos, com amor e compaixão.
Foi
então que a minha mãe Lua falou e disse: “Vós sois muitos, pertencentes à mesma
espécie, mas nem todos são iguais, a natureza é sábia, tudo tem que ter equilíbrio
no mundo. Existe o certo e o errado, o que está em cima e o que está em baixo,
o dentro e o fora, o cheio e o vazio, a alegria e a tristeza. Para existir dor,
também tem de haver saúde, para existir o bem, também tem de haver o mal, o yin
e o yan. Vocês só têm de se juntar para formar um grande exército de Paz, de
Luz branca, de compaixão e de amor incondicional. Nunca lutarás com armas, as
tuas armas serão as tuas mãos, para que trates dos teus inimigos, para que lhes
cures as maleitas e dores, o teu dom será amá-los como teus irmãos, ampará-los
na queda mostrando-lhes o chão onde caem, pois eles não o conhecem, nunca o
olham, não sabem que existe. Cabe-te a ti e ao teu exército mostrar a compaixão,
que vos arma e vos une, nesta causa tão grande e digna, de salvar a nossa casa,
a nossa terra. Prostrem-se em agradecimento e mostrem-lhes como o devem de
fazer, para que aprendam convosco. A nossa luta será a deles, dos agora nossos
inimigos, inimigos do planeta, porque estão cegos e não vos vêm, estão surdos e
não vos ouvem, estão mudos e não vos falam! Acreditem, tenham fé em vós mesmos
guerreiros solitários espalhados pelo mundo, quando se juntarem e formarem
juntos o tão desejado exército da compaixão serão muitos e vencerão!”
Assim
falou a minha mãe Lua e a Deusa apareceu nessa noite e disse:
“Que
assim seja, que assim se faça!”
MIA
PÚRPURA
MUITA
LUZ!
Imagem
retirada da net, desconheço o autor. O texto é da minha autoria.